Tratados

Guantánamo e a simbologia contra-terrorista: uma resposta

Num comentário via facebook relativo ao post de ontem, Sérgio Loureiro afirmou o seguinte:

 “Eu percebo a posição de princípio. Mas no mundo da política real, existem factos. E enquanto Guantanamo estiver aberto, certas coisas que lá se passaram (e outras) podem continuar escondidas. No momento em que se fechar Guantanamo, passa a existir uma luz legal em cima dessas zonas de sombra. A realidade política americana não está preparada para lidar com isto. Senão repara: Obama vai ter que explicar porque Guantanamo continua aberto, depois de ter prometido que fechava no espaço de um ano. Se ele está disposto a pagar o preço político de ter esta promessa não cumprida, é porque o preço político de cumprir a promessa é mais alto (e não deve ser pouco). Também não concordo com o teu preceito de que a “paz das nações” não se coaduna com os Jack Bauers. De facto, parece-me que Obama usa muito bem o proverbial “talk softly and carry a big stick”. É por ele demonstrar que não hesita em usar a realpolitik que se pode permitir matar piratas somalis, usar drones no Paquistão, fazer de Jack Bauer com o OBL, manter Guantanamo aberto, e dizer ao Bibi que a solução para a paz na Palestina passa pelas fronteiras de 67. Garanto que a análise custo-benefício destas coisas está feita e bem feita”.

Transcrevi o comentário porque este traz ideias interessantes que estimulam o debate e apontam novas direcções para a análise da questão de Guantánamo. Neste sentido, acrescento algumas ideias, dividadas por tópicos:

1 – A existência de um local como Guantánamo – A luta contra o terrorismo é vista como um combate que, por vezes, requer medidas excepcionais, pelo facto de o objecto a combater usar estratégias e instrumentos pouco susceptíveis de serem eficazmente combatidos com os meios habituais. Eu reconheço isso, e quem estuda contraterrorismo sabe que é assim. Neste sentido, poder-se-ia chegar mais longe, dizendo que saber-se da existência de um local como Guantánamo é positivo, se se considerar que locais “acima da lei” existirão sempre e, apesar de tudo, sabe-se mais sobre Guantánamo do que sobre outros locais que nem se sabe se existem – mas que existem.

2 – Excepcionalidade – O problema com Guantánamo e com os desenvolvimentos a que tem sido sujeito está no factor “excepção”. Em muitos casos (quase todos?), podem não existir razões suficientes que justifiquem a manutenção dos prisioneiros em condições tão excepcionais. Para muitos analistas, Guantánamo não deveria sequer existir; mas mesmo quem defende a sua existência costuma reconhecer a insuficiência das provas que retêm muitos dos prisioneiros neste centro. A excepcionalidade que poderia justificar Guntánamo (aos olhos de alguns analistas) não se alarga a todos os prisioneiros, e as perspectivas actuais, baseadas em legislação que congressistas e senadores estão a tentar aprovar, apontam para uma “normalização da excepcionalidade”: os critérios para justificar a excepcionalidade serão menos apertados.

O texto anterior tem, portanto, duas ideias de partida:

  • A promessa de Obama de fechar Guantánamo não se cumpriu
  • A promessa de Obama de fechar Guantánamo parece estar mais longe de se cumprir

3 – “Talk softly and carry a big stick” – Sim, Obama desilude os seus apoiantes mais pacifistas. E ainda bem. Desgraçado o mundo em que os pacifistas fanáticos prevaleçam. Mas julgo que a retórica e a simbologia do pós 11 de Setembro têm de ser ultrapassadas, e não o serão enquanto um lugar como Guantánamo estiver a funcionar a todo o gás. Além disso, como referi ontem, isso poderia ser mais eficaz no longo prazo.

4 – E a UE? – A política contra-terrorista da UE consubstancia-se num conjunto de instrumentos que visam reforçar a cooperação policial e judicial entre os Estados membros e num conjunto de acções ao nível da política externa. Toda a actuação europeia privilegia a dimensão legal deste combate em detrimento da dimensão militar, com o objectivo de desglamourizar o terrorismo islâmico. O Coordenador da Luta Anti-Terrorista na UE afirma que os prisioneiros de Guantánamo fazem parte do discurso dos terroristas, enquanto que dos condenados pelos atentados de Madrid ninguém ouve falar. E isso é verdade. Mas esta retórica desmonta-se quando confrontada com situações-limite. Exemplos? A UE advoga o fecho de Guantánamo, mas depois muito poucos países europeus estão dispostos a acolher antigos prisioneiros (Portugal é uma excepção a esta tendência, uma vez que alberga dois sírios que estiveram naquela base). E a UE advoga o primado da lei e do direito, enquanto dá os parabéns a Obama pelo “huge sucess” que foi a morte de Bin Laden.

Maio 26, 2011 Posted by | Sem categoria | , , , , | 2 comentários

ANÁLISE :: Guantánamo e a simbologia contra-terrorista

Getliberty.org

Para além de benefícios políticos evidentes, a Administração Obama deveria aproveitar a morte de Bin Laden para retirar dividendos estratégicos de longo prazo, no que à segurança diz respeito. Para os americanos, a morte de Bin Laden foi um sucesso político e militar com implicações ao nível simbólico e operacional. Mas, para que estas implicações (em ambos os planos) fossem efectivamente optimizadas, o passo seguinte teria de ser dado. E esse passo seria fechar Guantánamo.

As perspectivas relativas a este desfecho não são optimistas. Guantánamo tem sido uma pedra no sapato de Obama, uma pedra que dificulta a sua caminhada em direcção a uma das suas principais promessas. Fechar Guantánamo está cada vez mais longe, à medida que senadores como John McCain e Lindsay Graham e o congressista Buck McKeon vão propondo legislação que torna a excepcionalidade de Guantánamo menos excepcional, alargando os casos em que a detenção sem julgamento é permitida e afrouxando o freio que separa a regra da excepção. Se Bin Laden é o símbolo do terrorismo islamista do século XXI, Guantánamo é o símbolo nefasto do contra-terrorismo americano pós 11 de Setembro. Se acabar com um símbolo comportasse acabar com outro, poderíamos começar a pensar em passar para um nova fase. Assim, não.  

Maio 25, 2011 Posted by | Sem categoria | , , , | 1 Comentário

Morte de Bin Laden (I)

A morte de Bin Laden é uma notícia altamente relevante. Mas não é por isso que deve ser necessariamente qualificada como boa ou má. Admitindo que a sua morte fosse um objectivo táctico muito importante das forças norte-americanas, nem por isso temos de ficar contentes, rejubilando com este resultado. Por muito ingénuo que possa soar, sinto-me desconfortável a ouvir Obama dizer que se fez justiça. “Agora que finalmente o matámos, fez-se justiça”. Não. Não é uma justiça repadora, obviamente, nem corrige nada. Era um objectivo político e militar politica e militarmente legítimo, mas não era algo do foro da justiça.

Vindo eu de um país que aboliu a pena de morte há bem mais de 100 anos, sendo o primeiro país do mundo a fazê-lo, custa-me ouvir o nosso MNE, em comunicado, dar os parabéns aos EUA pela morte de uma pessoa. Lamento, mas não deixo de achar um pouco medieval.

Maio 2, 2011 Posted by | Sem categoria | , , , | 3 comentários

ANÁLISE :: Crise no Egipto e UE

Cathy Ashton emitiu hoje um comunicado com o qual tenta marcar o jogo diplomático por detrás da revolta egípcia. O comunicado começa com uma expressão de intenções, bem típica da imagem que a UE tem de si: “Passámos uma mensagem forte às autoridades egípcias”. Depois, dirige-se às autoridades egípcias para que restabeleçam a ordem, recordando que são elas as responsáveis pela protecção dos cidadãos. Ashton termina instando à adopção de medidas urgentes, concretas e decisivas que vão de encontro às aspirações democráticas dos cidadãos egípcios, para que se possa embarcar numa transição significativa e real em direcção a uma reforma democrática genuína, abrindo caminho para a realização de eleições livres e justas.

Se, no primeiro dia de revolta nas ruas do Cairo, foi Hillary Clinton a porta-voz da Administração americana, a partir de então tem sido Obama a assumir publicamente a condução da actuação de Washington em torno da (espera-se) proto-revolução egípcia. Obama percebeu que, do ponto de vista da política internacional, os acontecimentos no Egipto podem originar uma mudança de paradigma, cujas consequências deverão ser contidas e controladas. Os Estados Unidos têm liderado, sem surpresa, a pressão internacional em torno do regime de Mubarak. Mas o que estas semanas de revolta nas ruas da Tunísia e do Egipto têm demonstrado cabalmente é a falta de presença da UE nos processos de influência de uma sucessão de eventos decisivos numa área fundamental do seu contexto geoestratégico.

O chamado Processo de Barcelona, lançado em 1995, criou a Parceria Euro-Mediterrânica, uma estratégia que visava aproximar ambas as margens do mar Mediterrâneo através da prossecução de políticas organizadas em três domínios (“baskets”):

1) Questões de segurança, incluindo temas relacionados com as formas de organização e governação política, democracia e protecção dos direitos humanos;

2) Cooperação económica

3) Reforço de cooperação ao nível da sociedade civil e promoção da cidadania.

Posteriormente, a UE lançou a sua Política Europeia de Vizinhança, onde prosseguia uma cooperação mais estreita com os seus vizinhos a sul e a leste, mas desta feita numa base bilateral. Tanto o Egipto como a Tunísia têm acordos bilaterais assinados com a UE.

Os acontecimentos dos últimos dias têm mostrado que a estrutura institucional que a UE desenvolveu com os países do Mediterrâneo não lhe conferiu suficiente força política nessa região. A cooperação existe em áreas como controlo dos fluxos migratórios ou facilitação de trocas comerciais, mas a verdade é que influência da UE nas questões fundamentais da governação política é residual. Por fim, a actuação de Cathy Ashton e do seu gabinete tem alimentado os argumentos de quem defende a sua total desadequação para um cargo que é novo e que, por isso, requeria proactividade, rasgo e força política – características que Ashton não tem nem nunca terá. Após mais de um ano de mandato e de uma sucessão de crises internacionais onde a sua actuação tem sido avaliada, o balanço já pode começar a ser feito: para já, do ponto de vista dos interesses da UE e das suas expectativas pós-Lisboa, Ashton tem sido pouco menos do que um desastre.

Fevereiro 3, 2011 Posted by | Sem categoria | , , , | 3 comentários

NATO-Lisbon :: O unilateralismo norte-americano (autores convidados)

A questão do unilateralismo norte-americano nem nasceu com Bush nem desapareceu com Obama. É um debate que, como Åsne Kalland Aarstad explica hoje, tem implicações e custos em termos de definição de agenda política. O multilateralismo também tem custos, mas ainda assim a Administração Obama tem dado sinais de encarar a NATO numa perspectiva predominantemente multilateral – o discurso em West Point em Dezembro de 2009 e a posição em relação ao escudo antímíssil parecem secundar esta visão.

 

 

U.S unilateralism and NATO

U.S. unilateralism did not suddenly ’occur’ after 9/11, as the country has a long history of an ambivalent and selective attitude toward multilateral engagement. Parallel with this ambivalent attitude, however, the U.S. has continued to promote international institution, partly as a foundation of global leadership, but also as a general posture of self-restraint (’self- binding’) in the exercise of power. The Bush administration early signaled a new course and tone after having entered office in January 2001, by abrogating the Anti-Ballistic Missile Treaty with Russia, ’un-signing’ the Rome Statute of the ICC and opposing a draft UN convention to reduce illicit trafficking in small arms and light weapons, to mention a few. The events of 9/11 accelerated the unilateralist thrust of the Bush administration’s foreign policy, by reinforcing the administration’s skepticism of multilateral institutions. The nature of new threats, time-consuming multilateral diplomacy and the ’constraints of international legitimacy’ were seen as a dangerous and inefficient combination in the new post 9/11 security environment.

When the U.S. declared a ’global war on terror’, and furthermore insisted on waging this war unrestrained by the requirement of multilateral consensus in NATO, the country took a distinctive turn way from the self-binding strategy that it had previously pursued through multilateral cooperation. The Bush Administration decided to fight wars in Afghanistan and Iraq through ’coalitions of willings’, and specifically turned NATO’s Article 5 call for assistance down. ’As a result, in the view of many, NATO came to be treated by the United States a little more than a military contractor of first resort’, according to Mark Berdal & David Ucko. It could thus be tempting to suggest that NATO reached a point where its most important member state found the costs related to cooperation higher than ’doing it alone’, and as such that NATO lost much of its relevance.

However, the U.S.’s unilateralist action both in Afghanistan – and to an even larger extent in Iraq – can be claimed to have been a costly affair for the U.S., in particular with regards to the lengthy reconstruction and stabilization processes currently ongoing. In some respects, the missions in Afghanistan and Iraq served to demonstrate the advantages to be gained from bypassing NATO and working with a more flexible international coalition: ’The U.S. – led coalitions were unencumbered by the institutional constraints of alliance decision making, while Washington was able to pick and choose only what it wanted – and needed – from NATO assets and member states’, according to Michael Williams. Nevertheless, the flip-side of this decision came in the shape of vast challenges for conducting efficient post-war reconstruction and stabilization in the absence of facilitating institutional structures. ‘War by committee’ may not be the most efficient or least frustrating method for conducting military operations, but it does make each contributing nation a stakeholder in the operation and more likely to carry a proportionate share of the burden.

As such, the overall record of the Bush administration can be seen as providing evidence of the costs and limitations of ’doing it alone’. The slow realization by the Bush Administration that Iraq indeed was going to be a long and costly affair, revealed serious miscalculations about the reconstruction processes of its own military engagement. Similarly, the initial American insistence that Afghanistan was to remain outside NATO military structure, led to a complicated situation where the American-led Operation Enduring Freedom (OEF) and the NATO commanded International Security Assistance Force (ISAF) were formally kept separate even though their missions were complementary. This has gradually changed, as the Bush administration came to recognize that by initially rejecting NATO oversight, ’the high cost of operational incoherence and inefficiency far exceeded any potential gain of operational freedom’, according to James Sperling & Mark Webber. The overall judgment of the Bush Administration’s unilateral turn should thus be evaluated on the basis of the total costs of its agenda. There are reasons to believe that the ’annoying costs of multilateralism’ are likely to appear pale in comparison to the vast resources needed to sustain a unilateralist agenda, to borrow a formulation by Lisa Martin.

After the Obama Administration entered office in January 2009, there have been signs that the new administration seek to break with the Bush Administration’s ’do it alone’ mantra. It is not entirely clear how this will come to influence NATO, but Obama has taken steps to signal a closer commitment to the Alliance, for example in his speech at West Point given in December 2009 on the new Afghan war strategy. Another important development is Obama’s decision to put missile defense fully back within a NATO context, rather than through bilateral agreements (NATO Group of Experts). The new U.S. NATO Permanent Representative, Ivo Daalder, expressed a firm belief in continued institutional cooperation in his New York Times op-ed on the 18th of October:

’In today’s globalized, complex and unpredictable security environment, no country — and neither organization — can afford to stand alone.’

Åsne Kalland Aarstad – aasneka@gmail.com

Novembro 15, 2010 Posted by | Sem categoria | , , | Deixe um comentário

ANÁLISE :: Economia da expansão dos colonatos

O porta-voz da Alta-Representante Cathy Ashton veio hoje reagir ao anúncio de Israel de que vai construir mais 1300 casas na Cisjordância. A expansão dos colonatos esteve congelada até Setembro mas agora, conforme esperado, a desfaçatez regressou (lamento mas é a palavra que me ocorre). No comunicado apresentado hoje, a UE reafirma a ilegalidade dos colonatos à luz do direito internacional e sublinha que a construção destas habitações em Jerusalém Oriental é um obstáculo à paz e que ameaça tornar impossível a solução dos dois Estados.

Para Cathy Ashton, a realização de avanços no processo de paz é claramente uma prioridade. Isso tem sido verificado ao longo deste seu primeiro ano de mandato e constitui talvez a principal marca que tem deixado neste período. Confrontado com sucessivas crises, o estado actual da relação entre Israel e a UE reflecte o desencanto – recíproco – entre os parceiros, e surge como uma das consequências mais previsíveis das eleições que recolocaram Bibi Netanyahu no poder, em Fevereiro de 2009. A linha política seguida pela direita israelita não é subscrita nem pela UE nem pela actual administração norte-americana, mas isso continua a não perturbar decisivamente o rumo seguido por Netanyahu. O que é que será preciso para que o status quo se altere?

Provavelmente, só os factores demográfico e, por arrasto, económico. Numa altura em que a população de Israel é, em mais de 20%, árabe, e em que as taxas de crescimento entre esta franja social são superiores aos restantes israelitas, a crescente anexação de facto de mais território só aumenta os encargos económicos e sociais do Estado judaico. Por um lado, a discriminação que existe em relação à minoria árabe israelita impede que estes cidadãos se sintam “tão israelitas” como “os outros”; e os encargos advindos da expansão de colonatos (estradas, despesas com segurança, muros, etc) são relevantes, do ponto de vista económico. Portanto, mesmo do ponto de vista social e económico (pelo menos destes), a construção de um Estado palestiniano é positiva para Israel. Mesmo olhando para esta questão de um ponto de vista dos interesses israelitas, a crescente expansão dos colonatos não faz sentido, tanto em termos de diplomacia internacional como numa perspectiva económica e social. Por isso, todas as iniciativas que atrasem e comprometam este desfecho são prejudiciais a Israel.

Novembro 9, 2010 Posted by | Sem categoria | , , , , , | Deixe um comentário

Administração Obama e agora tudo vai mudar para melhor.

A Embaixadora dos Estados Unidos na Dinamarca veio hoje à universidade falar sobre as relações entre os Estados Unidos e a União Europeia. Só falou dos Estados Unidos.

Setembro 22, 2010 Posted by | Sem categoria | , , | 2 comentários

Por que não sou contra o centro cultural islâmico em Manhattan

Se estivesse em posição de ter de tomar decisões, não tomaria a iniciativa de propor a construção de um centro cultural islâmico perto do local dos atentados de 2001. Saberia que estaria a ferir algumas sensibilidades entre o grupo de vítimas e familiares de vítimas dos ataques, estaria a dar argumentos a quem não pensa da mesma forma que eu, e teria poucos ganhos. Por isso não me lembraria de propor tal iniciativa.

Se, no entanto, a proposta me chegasse às mãos, e exigisse uma tomada de posição, não me oporia. Porque é nas situações-limite, quando surgem os desafios, que a verdadeira força das convicções e dos valores se deve afirmar. Poderia sempre dizer-se que não se trata de uma mesquita, que não é no ground zero, que esta é uma “não-questão”. Mas isso, respectivamente, não seria nem rigoroso nem verdade. Seria uma forma de, politica e levianamente, tentar escapar entre os pingos da chuva sem se molhar, sem se pronunciar sobre o que está em causa. E, para mim, a questão que está em causa verdadeiramente – a construção de um local afecto ao islão perto da zona dos atentados de 2001 – trata-se em torno de duas ideias principais:

– os atentados terroristas – estes e outros – foram (e são) praticados por uma escandalosa minoria dos muçulmanos. Também por isso, não devem pôr em causa o princípio da liberdade religiosa, da liberdade de culto e o respeito pelas liberdades fundamentais. Do ponto de vista retórico, os ataques são feitos “em nome do islão”, mas não em nome do islão maioritário. Muitos dos principais problemas associados ao islão são, no mínimo, passíveis de muita discussão e não são praticados pela maioria (ou sequer por uma minoria significativa) dos muçulmanos. Quantas pessoas estão sob a sharia? Qual é a percentagem de muçulmanas que usa burqa ou véu integral? Os terroristas – estes terroristas – são muçulmanos, mas não são terroristas por serem muçulmanos.

– O argumento mais forte para sustentar esta posição é a quantidade de muçulmanos mortos em sequência de ataques terroristas praticados por outros muçulmanos. Se o seu problema fosse “só” os Estados Unidos, Israel ou o modo de vida ocidental, não morriam centenas de muçulmanos todos os meses no Iraque e no Afeganistão. A sua agenda é política, não religiosa. Não ignoro que, retoricamente, o uso da alavanca do islão é mobilizador nos processos de recrutamento de activistas; não ignoro que a justificação dos actos com recurso ao islão aumenta a base de apoio dos ataques. Mas a verdade é que a agenda dos terroristas é eminentemente política. Mesmo o desejo de reinstaurar uma espécie de “califado” no mundo ocidental é um desejo político. E, por isso, é nessa esfera que o fundo problema deve ser tratado. É isso que a racionalidade requer.

Obama: “We are not at war with Islam, but with terrorists that have distorted Islam”

Setembro 11, 2010 Posted by | Sem categoria | , , | 1 Comentário

“In this area code, you call me”

O novo embaixador da UE nos Estados Unidos, o português João Vale de Almeida, deu um conjunto de entrevistas a vários órgãos de comunicação social americanos. Sobre a omnipresente “pergunta de Kissinger” (merece uma entrada em qualquer glossário de EUropês), respondeu bem: “Na área com este indicativo, ligue-me a mim”. Quando questionado acerca das áreas que merecerão intervenção prioritária, referiu que estas serão o Irão, o Afeganistão, o Paquistão e o Médio Oriente. Ao mesmo tempo, escreveu uma carta a Obama, onde tenta desvalorizar a proeminência que a relação com a China está a ter na política externa norte-americana. Mas como bem se sabe, isto não vai lá com cartas e com declarações de vontades; é preciso um pouco mais. O que falta saber é se a UE pode dar o que ainda falta.

Um apanhado destas entrevistas pode ser visto neste artigo do EU Observer

Agosto 11, 2010 Posted by | Sem categoria | , , , , , , | Deixe um comentário

O ponto de partida

Copyright © Steve Bell 2008

Netanyahu viajou ontem à noite para Washington afim de reunir com Obama e de procurar estreitar laços diplomáticos com a Administração. Como se viu no passado recente, partir para este tipo de encontros com uma mão cheia de nada é contra-producente, e é por isso que na pasta do primeiro-ministro israelita vai um conjunto de propostas que ilustram uma nova abordagem israelita em relação ao processo de paz.

Em relação a este quinto encontro entre Obama e Netanyahu, o Haaretz descreve o estado actual desta relação de forma lapidar: “Obama is not convinced that Netanyahu is serious in his declared intentions regarding the process, and the Israeli premier is not confident that the current American administration is committed to maintaining the same relations with Israel as those held by its predecessors.” Mas isto não reduz, necessariamente, as expectivas quanto ao desfecho da reunião, uma vez que, sendo tão baixo o ponto de partida, o saldo do encontro pode até ser positivo.

Entretanto, Cathy Ashton pronunciou-se sobre as novas medidas propostas pelo Governo de Netanyahu relativamente a Gaza, congratulando-se com o facto de esta política poder ter impacto real na melhoria da qualidade de vida da população. Se a comunidade internacional perceber que só com grande pressão diplomática as coisas se começam a resolver, então aí tudo será melhor para todos – incluíndo os israelitas.

Julho 6, 2010 Posted by | Sem categoria | , , , | 4 comentários

ANÁLISE :: Batalha Naval afunda Israel

Há dias diziam-me que, por paradoxal que parecesse, a crise em torno do ataque israelita à flotilha ao largo de Gaza iria acabar por ser benéfica. Para os israelitas, o desastre diplomático comportaria um preço a pagar, e em última instância, levaria à quebra do status quo em relação a Gaza, inadmissível para a comunidade internacional mas, ainda assim, não tanto ao ponto de esta ser proactiva tendo em vista a resolução do problema. A morte  de 9 cidadãos turcos e a detenção, por umas horas, de centenas de cidadãos europeus e americanos, serviu de desbloquador. Agora que se perspectiva o levantamento de parte de bloqueio, os próximos desenvolvimentos dar-se-ão em dois tabuleiros.

Perspectivas internas

Numa esquizofrénica duplicidade de discursos, Netanyahu anunciou que iria aliviar o bloqueio fronteiriço a Gaza, que foi iniciado em 2007 após o Hamas ter assumido o poder neste território. Mas este anúncio apenas foi feito na versão em inglês, dirigida à comunidade internacional e aos jornalistas de órgãos de comunicação estrangeiros. Na versão em hebraico não houve menção a esta decisão. Pode especular-se sobre onde está a mentira, e se o seu objectivo está fora ou dentro das fronteiras do país (o governo pretendeu enganar a comunidade internacional ou os israelitas?), mas, em todo o caso, Netanyahu está a ser vítima de uma coligação ampla demais, onde se reflectem visões muito diferentes, e, também por isso, não tem sido o líder de que os israelitas tanto precisavam. Esta situação hilriante é bem reveladora desta tendência. Uma das últimas coisas de que Israel necessitava agora era de instabilidade política interna; mas a última seria mesmo um governo à deriva e à mercê de franjas mais radicais e incapaz de contrariar a crescente ortodoxidade social do país.

O novo contexto externo

Ao inserir-se numa linha de acontecimentos que, nos últimos 18 meses (desde a ofensiva em Gaza iniciada em 26 de Dezembro de 2008), têm contribuido para um progressivo isolamento internacional, o ataque à flotilha facilitou a opção de alguns indecisos que ainda balançavam entre ambos os lados e fez engrossar a massa dos que rejeitam firmemente este tipo de acções israelitas. A Administração Obama persegue uma linha mais exigente do que as suas antecessoras e a ONU continua na senda do respeito pelo direito internacional, caminho este que, mais tarde ou mais cedo, acaba por colidir com Telavive. Quanto à UE, é importante que se saiba que as suas fortes relações económicas com Israel são condicionadas pelo processo de paz com os palestinianos. E não se trata apenas de uma questão de retórica discursiva e de pressão diplomática; as negociações em torno do upgrade das relações entre ambos os lados, que ocorreram intensamente durante 2008, foram suspensas e não há, ainda, qualquer perspectiva de novo acordo. Neste momento, o instrumento jurídico de regula a relação, o Plano de Acção, viu o seu prazo de validade inicial expirado e sucessivamente prolongado. “Não mata mas mói”: parece ser essa a posição de Bruxelas, e, com efeito, o que se espera é que moa.

Junho 18, 2010 Posted by | Sem categoria | , , , , , | Deixe um comentário

Pelo menos no papel

Obama hoje sobre o “fim da guerra ao terrorismo” – “Procuraremos sempre deslegitimar a utilização do terrorismo e isolar os que a ele recorram”, indica o documento, citado pela agência francesa. Mas “não há uma guerra mundial contra uma táctica – o terrorismo – ou uma religião – o islão“.

Maio 27, 2010 Posted by | Sem categoria | , , | Deixe um comentário

ANÁLISE :: Negociações indirectas entre israelitas e palestinianos

No passado sábado, o impasse em torno da possibilidade de retoma das negociações indirectas entre israelitas e palestinianos foi desbloquado e as conversações, sob mediação de enviados norte-americanos da equipa de George Mitchell, foram encetadas ontem. Este foi o primeiro passo concreto, em 18 meses, a conferir sentido à expressão “processo de paz”. Há ano e meio que não havia processo de paz.

Ao patrocinar este avanço, a Administração de Obama concretiza o seu empenhamento na questão, na tradição das Administrações americanas. Mas a escalada da retórica entre Washington e Jerusalém verificada nos últimos meses poderá marcar o desfecho das conversações e apontar novos desenvolvimentos para o futuro. Philip Crowly, Secretário de Estado adjunto, deixou bem claro que, se nesta fase algumas das partes tomar acções que comprometam a confiança mútua, serão responsabilizadas pelos mediadores norte-americanos, que não obstante asseguram que não deixarão cair as negociações.

Para já, Mahmoud Abbas comprometeu-se a combater qualquer tipo de incitamento à violência, e Netanyahu assegurou que, durante os próximos anos, nenhuma casa será construída em Ramat Shlomo. Foi esta última questão que esteve na origem do surto de tensão entre norte-americanos e israelitas há algumas semanas, e esteve agora na génese do princípio de acordo. Apesar de ambos serem objectivos pouco ambiciosos e pouco tangíveis (o que é incitamento? E quanto aos outros colonatos?), são um sinal positivo dado pelos intervenientes, o primeiro desde a ofensiva israelita em Gaza iniciada em Dezembro de 2008. No entanto, como todos os intervenientes sabem, será preciso muito mais do que isto para se aspirar a um desfecho positivo do processo de paz. 

Maio 10, 2010 Posted by | Sem categoria | , , , , | Deixe um comentário

Bruxelas, Washington e os pontos nos ii

Na conferência em que me encontro agora, a sessão mais interessante tinha o sugestivo nome “Do Transatlantic Relations Still Matter?” Como bem apontou o Embaixador francês no Canadá, para muita gente, esta questão no fundo significava: “Does Europe Still Matter?” Mas a verdade é que as relações transatlânticas nunca foram tão boas como tem acontecido desde o fim da guerra fria.

Contrariando discursos como os de Robert Kagan sobre Marte e Vénus, e assumpções/generalidades que dizem que a UE e os EUA, sobretudo durante a Administração Bush, se afastaram definitivamente, alguns analistas dizem precisamente o contrário. Andrew Moravcsik, da Universidade de Princeton, é deliciosamente persuasivo ao dizer que, mesmo na questão mais suspeita – intervenções militares dos EUA – a sintonia Bruxelas-Washington nunca foi tão forte. Durante a Guerra Fria, e desde a guerra da Coreia, praticamente todas as intervenções americanas tiveram a oposição dos (Estados) europeus. Vietname, Nicarágua, Suez, entre tantas outras, criaram verdadeiras crises atlânticas. Em sentido contrário, desde os anos 90, das várias intervenções “out of area” dos americanos, apenas a Guerra do Iraque (somente a segunda, porque em relação à primeira não houve problemas) gerou oposição europeia. E esta constatação surge na área que, normalmente, a incompatibilidade é apontada como sendo mais evidente. O resto é a democracia, comércio, direitos humanos, liberdades individuais, cooperação militar e estratégica, partilha de informação, investimento em conhecimento científico, e por aí fora.

Além disso, por muito que a retórica dominante aponte alegadas incompatibilidades insanáveis em muitas questões, em áreas como o contra-terrorismo, por exemplo, a “realidade real”, a implementação na prática, mostra uma cooperação que, hoje, é maior do que era há anos atrás. Na verdade, os preconceitos gerados à volta do inquilino da Casa Branca fazem toda a diferença para a maior parte dos analistas. Já reparam que Guantánamo continua por fechar, Israel continua a expandir os colonatos, não há qualquer miragem de processo de paz no Médio Oriente e a situação no eixo Afeganistão/Paquistão piorou? E já lá vai ano e meio.

Abril 17, 2010 Posted by | 1 | , , , | Deixe um comentário

ANÁLISE :: As duas faces dos falhanços de Netanyahu

Como é sabido, as linhas com que Israel cose a sua política externa e de segurança são diferentes das de qualquer outro país, muitas vezes um pouco para lá daquilo que, desde há uns 150 anos para cá, se vem chamando de direito internacional. Por vários motivos, uns mais, outros menos justificáveis, a chamada ‘comunidade internacional’ apresenta um comportamento que, tanto do ponto de vista jurídico como, sobretudo, político, tem validado explícita ou tacitamente muitas das opções dos governos de Telavive. (Já agora, é engraçado chamar-se no estrangeiro ‘governo de Telavive’ quando todos os ministérios – exceptuando o da defesa – e o Knesset estão em Jerusalém, a verdadeira capital de Israel.) Mas nem todas as regras são eternas nem as relações são imaculadas, por mais fortes e inquebrantáveis que sejam

E é por isso que, em certas alturas, as coisas correm menos bem. Ontem, Israel sofreu mais dois fortes abalos no seu prestígio internacional, duas afrontas protagonizadas por dois dos seus aliados mais importantes. O Reino Unido expulsou um diplomata israelita por suspeitas de ser um dirigente da Mossad e de ter estado envolvido na falsificação de passaportes britânicos utilizados no assassinato no Dubai de um dirigente do Hamas (Miliband foi bem explícito e bem duro na retórica), há umas semanas atrás, e a reunião Obama – Netanyahu, segundo o New York Times, aparentemente não contribuiu para resolver a tensão surgida nos últimos dias entre os dois grandes aliados. Netanyahu está agora a colher os “frutos diplomáticos” das sementes que foi criando ao longo de um ano de Governo, e parece ficar um pouco isolado relativamente a Londres e Washington. Agora, saber se isso o preocupa ou não é outra questão…  

Março 24, 2010 Posted by | 1 | , , , | Deixe um comentário

Geografia da expansão dos colonatos

No passado mês de Novembro, a Foundation for the Middle East – uma das instituições cujas publicações estão na lista de leituras obrigatórias – publicou um mapa com os planos de expansão dos colonatos israelitas até 2015 e 2020, que prevêm a construção de 14.123 casas em território palestiniano, próximo da fronteira com Israel. Não tenho números acerca da média de elementos por agregado familiar nos colonatos, mas sei, por experiência própria, que a densidade populacional (judaica) nos colonatos é bem superior à do restante território israelita, uma vez que muitos colonos vestem a pele de pioneiros missionários para os quais a demografia é uma arma. Com isto quero dizer que estas casas corresponderão a pelo menos 50.000 novos colonos israelitas nos territórios da Palestina.

Trago agora este mapa a este espaço uma vez que ali, em Novembro, estavam já previstas as 1600 novas habitações de Ramat Shlomo, aquelas cuja construção aparentemente esteve no início da tensão israelo-americana. Faço esta nuance porque os anúncios de expansão dos colonatos são usuais desde que Netanyahu chegou ao poder e terminou com a hipocrisia do anterior Governo, que clamava que havia congelamento dos colonatos e depois era ver as máquinas a trabalhar sem parar. Reitero o que disse no post anterior acerca deste tema: a Administração Obama assume agora uma nova linha de ruptura com Netanyahu porque decidiu estrategicamente elevar a retórica, e não porque se sentiu especialmente insultada pelo anúncio de expansão de colonatos – expansão esta que, como se vê, estava prevista desde há vários meses.

Na parte direita do mapa vê-se o colonato de Ma’ale Adumim. Este é um dos destinos obrigatórios das visitas que organizações israelitas de direitos humanos promovem destinadas a jornalistas e diplomatas estrangeiros, e que os leva a visitar a geografia da expansão dos colonatos. Visitei Ma’ale Adumim e vi uma cidade de 50 000 pessoas, com escolas, quartéis de bombeiros, shoppings, cinemas, piscinas, e jardins verdejantes rodeados de terra árida. Olha-se para fora do colonato e vê-se uma paisagem quase lunar, com terra seca, montes, e mais nada. Quem acha que os colonatos serão desmantelados mais cedo ou mais tarde numa solução definitiva nunca viu Ma’ale Adumim.

Março 22, 2010 Posted by | 1 | , , , , , | Deixe um comentário

ANÁLISE :: Surto de violência em Israel

A actual situação de tensão entre Israel e palestinianos, por um lado, e entre Israel e os EUA, por outro, tem vindo a ser cozinhada desde há ano e meio, desde o surto de violência protagonizado pelos colonos israelitas e que os opôs tanto aos palestinianos como às próprias forças de seguranças israelitas. Já na altura escrevi, num paper para o CEPESE da Universidade do Porto, que estas acções colocavam o Estado judaico perante um desafio ao Estado de direito e ao primado da lei. Nesse teste, Israel chumbou. Netanyahu e o seu governo de coligação com extremistas mais radicais do que Bibi, eleitos alguns meses depois, têm feito o resto. É  provável que, com Livni, a situação fosse diferente.

O quadro actual é formatado por duas ideias basilares: por um lado, a contínua expansão de colonatos israelitas está a fazer transbordar a ira dos palestinianos e, como já tantas e tantas vezes foi dito, enquanto este movimento persistir, não há sequer miragem de processo de paz. É uma contradição em si mesma. Por outro lado, a  tensão com os Estados Unidos parece chegar do facto de Obama e Hillary Clinton estarem a permitir que se perceba que perceberam que não têm em Netanyahu um parceiro credível para negociar. A escalada de retórica da parte de Washington surge agora por, com o Vice Joe Biden em Israel em viagem e tentativa de relançamento das negociações, persistirem os anúncios de que a expansão dos colonatos irá continuar, desta feita com mais 1600 casas em Ramat Shlomo. Washington considerou este anúncio um insulto, mas a verdade é que insultos destes há todos os dias. Aguarda-se a posição da Administração Obama neste que é, até agora, o maior desafio colocado perante si no que respeita ao seu empenho na resolução do problema israelo-palestiniano. Netenyahu terá percebido a fraqueza de Obama no que concerne ao conflito e foi esticando a corda. A verdade é uma: se nos últimos anos não houve senão retrocessos, a evidência empírica aponta para a necessidade óbvia de se mudar a abordagem.

As hipóteses de haver uma escalada de tensão ao ponto de originar uma terceira intifada serão maiores se houver, também, uma escalada de retórica e a adopção de determinadas medidas por parte da Autoridade Palestiniana. Se há facções palestinianas interessadas neste cenário, outras há para quem só o cenário actual é conveniente. A Fatah saberá que a violência potencia o extremismo e, por isso, beneficia em última instância o Hamas. E é nesta balança que os seus líderes terão de actuar, sendo certo que qualquer decisão tomada terá implicações decisivas na política da região.

(corrigido)

Imagem: UPI.com

Março 16, 2010 Posted by | 1 | , , , , , , , , | Deixe um comentário

ANÁLISE :: Iémen, Obama e contraterrorismo

O atentado terrorista falhado do dia de Natal trouxe a questão do terrorismo de novo para a ordem do dia nos Estados Unidos. Apesar de Obama ter assumido pessoalmente a falha do sistema de segurança interna dos EUA, os verdadeiros responsáveis operacionais são outros, e a organização do sistema americano de segurança volta a ser questionada. Há muitas questões que agora se levantam, e destas merecem-me atenção duas, em particular.

A Guerra ao Terrorismo

Ao declarar que a guerra ao terrorismo tinha terminado, Obama deu um sinal politicamente correcto, mas politicamente ineficiente. Se, por um lado, a expressão “guerra contra o terrorismo” é um guarda-chuva que serve para aligeirar muita coisa e para justificar medidas dificilmente justificáveis num cenário de paz, por outro é reveledora de que estes tempos são – ainda – excepcionais; continuam a ser excepcionais. E bastou uma tentativa de atentado para que toda a gente se apercebesse disto. Além disso, os scanner corporais, as dificuldades em voar para os EUA, o permanente reforço de tropas no Afeganistão e as acções no Iémen mostram que, se os EUA não estão em guerra contra o terrorismo, então ninguém sabe o que é uma guerra. Este argumento republicano é verdadeiro. Com Bush, apesar de tudo e de muitos abusos, a retórica era mais clara.

Iémen, statebuilding e contraterrorismo

 Não falta quem diga que o Iémen é um Estado falhado. Muitos já o diziam antes do atentado de 25 de Dezembro. Independentemente disso, importa discutir as estratégias de contraterrorismo aplicáveis aos Estados que serviram, mais ou menos conscientemente, de base para actividade terrorista. O que se poderá esperar agora da parte dos EUA? Que resposta haverá? Obama já disse que, de momento, não pretende enviar tropas para o Iémen. Por isso, e sabendo das dificuldades vividas do Afeganistão há mais de oito anos, tem de interrogar-se se o processo de “state building” é a forma mais eficaz de combater o terrorismo. Por muito que custe aos americanos – e aos europeus – não é possível fazer-se “state building” em todos os Estados potencialmente perigosos. O “state building” não é uma forma eficaz de se fazer contraterrorismo, pelo menos do ponto de vista da equação custo/benefício – se não, um terço de África e do Médio Oriente mereceriam intervenção Ocidental. As estratégias contemporâneas de contraterrorismo têm de adaptar-se à realidade actual.

Janeiro 13, 2010 Posted by | 1 | , , , | Deixe um comentário

Netanyahu e o braço-de-ferro

Muito boa a análise de Alexandre Guerra à questão da construção de 900 novas casas em Jerusalém Oriental. Netenyahu demonstra que, diplomaticamente, irá fazer valer as suas pretensões, independentemente da vontade de Washington; e confirma-se que Obama terá de se empenhar ao mais alto nível para conseguir avançar nas negociações de paz. Como Akiva Eldar escreve hoje no Haaretz, Netanyahu parece pressentir a fraqueza de Obama em questões relacionadas com o processo de paz, e é isso que tem permitido levar tão longe o braço de ferro com Washington. Obama terá de se envolver pessoalmente no processo de paz com uma profundidade superior à demonstrada até agora – só assim voltará a colocar Washington com um ascendente sobre Israel. 

Novembro 18, 2009 Posted by | 1 | , , , , | 1 Comentário

Reacções ao Nobel obâmico

Boa revista de imprensa e de reacções de Gina Soares, do IEEI, ao Nobel da Paz a Obama. Claro que, para mim, as críticas são muito mais pertinentes e justificadas; as reações positivas que o prémio recebeu são enquadráveis nas lógicas e no alinhamento político de cada um. Cada um reage de acordo com o que pensa acerca de Obama, da sua Administração ou dos EUA, mais do que com o que pensa em relação ao prémio em si. Mas com um Nobel da Paz tão politizado, tudo teria inevitavelmente de ser assim.

Outubro 20, 2009 Posted by | 1 | , | Deixe um comentário

ANÁLISE :: Irão nuclear, Israel e os Estados Unidos

Obama - NetanyahuHá mais de um ano que a principal linha de actuação da política externa israelita é enfatizar a ameaça nuclear iraniana e, assim, alastrar a percepção da ameaça a outros países, de modo a envolvê-los nessa “sua” luta. Claro que esta luta, em rigor, não é só sua, mas é também claro que em mais lado nenhum do mundo a percepção da ameaça é tão latente. A percepção é maior, mas será a ameaça, em si, também maior?

Ahmedinejad tem feito a sua parte neste processo de crescimento de tensão. As percepções de ameaça são fenómenos sociais muito complexos, e em Israel são extremamente exacerbados – mas com mais justificação do que por vezes se faz crer. Em “1967: Israel, the War and the Year that Transformed the Middle East”, Tom Segev relata de forma impressionante o clima vivido em Israel desde os finais de 1966 até ao início de Junho de 1967, às vésperas da Guerra dos Seis Dias. Era uma atmosfera de medo socialmente transversal, com um crescimento progressivo que fez com que, nos primeiros dias de Junho desse ano, o ataque preventivo israelita fosse já mais provável do que o ataque dos vizinhos árabes. Nestes processos de escalada, uns embarcam, outros não.

Netanyahu tem tentado convencer Obama da ameaça iminente que um Irão nuclear representa. Obama sabe disso, mas as soluções que adopta são diferentes das que Netanyahu deseja. Mas se fosse outro o Presidente americano? Em que ponto da escalada de tensão estaríamos agora, quando o tempo passa e Teerão avança no processo de nuclearização?  A avaliação das posturas dos dois líderes vai para além da frase da praxe “o futuro o dirá” – porque as atitudes de um líder moldam os acontecimentos. Esperemos que Obama esteja certo.

Foto: Haaretz,  aquando da visita de Netanyahu à Casa Branca, em Maio passado.

Outubro 16, 2009 Posted by | 1 | , , , , , | Deixe um comentário

“Obama reúne-se em separado com Netanyahu e com Abbas”

Luís Costa Ribas há pouco, na SIC Notícias:

Obama não pode querer a paz mais do que os israelitas ou os palestinianos, e é isso que está a acontecer“.

Tal e qual. Quer dizer: poder, pode; não adianta é nada.

Setembro 23, 2009 Posted by | 1 | , | Deixe um comentário

Não há processo de paz

west-bank-israeli-_1000389cÉ muito simples: enquanto houver crescimento de colonatos na Cisjordânia, não há processo de paz. Porque o “processo” que existe nesse caso vai contra qualquer perspectiva de paz. Neste momento, nem a mão miraculosa de Obama vale de nada: não há processo de paz. No conflito israelo-palestiniano poucas coisas são tão simples de entender.

JERUSALEM (Reuters) – Israel approved on Monday the building of 450 settler homes in the occupied West Bank, a move opposed by its U.S. ally and Palestinians but which could pave the way for a construction moratorium sought by Washington.

A Defense Ministry list of the first such building permits since Prime Minister Benjamin Netanyahu took office in March showed the homes would be erected in areas Israel has said it intends to keep in a future peace deal with the Palestinians.

Palestinian chief negotiator Saeb Erekat said Israel’s decision further undermined any belief that it is a credible partner for peace.”

Ler o resto aqui. Foto: REUTERS. Colonato de Ofra, na Cisjordânia.

Little boxes on the hillside,
Little boxes made of ticky-tacky,
Little boxes on the hillside,
Little boxes, all the same.
There’s a green one and a pink one
And a blue one and a yellow one
And they’re all made out of ticky-tacky
And they all look just the same

Setembro 7, 2009 Posted by | 1 | , , , , | 1 Comentário

Eleições no Afeganistão III

capt_kab11009180958_afghanistan_elections_kab110Os observadores europeus concluíram que as eleições de quinta-feira no Afeganistão foram “em geral boas e justas”, mas não inteiramente livres, porque a violência e intimidação afastaram os eleitores das urnas em várias partes do país. Um diagnóstico que é mais positivo do que o da principal organização afegã, que disse ter detectado “múltiplas fraudes”. No Público.

Reports of fraud and intimidation in Afghanistan’s presidential election continued to mount Saturday, with anecdotal but widespread accounts of ballot-box stuffing, a lack of impartiality among election workers and voters casting ballots for others. A particular concern was the notably low turnout of women, who election observer organizations said were disproportionately affected by the violence and intimidation. No New York Times.

THIS is the just war, the “war of necessity”, as Barack Obama likes to put it, in contrast to the bad war, the war of misguided choices in Iraq. But as a deeply flawed election went ahead in Afghanistan this week, there were echoes, in the mission by America and its allies, of the darkest days of the Iraq campaign: muddled aims, mounting casualties and the gnawing fear of strategic defeat. Gloomy commentators evoke the spectre of the humiliations inflicted by Afghanistan on Britain in the 19th century and the Soviet Union in the 20th. Na Economist.

Imagem recolhida em www.bittersweetme.net.

Agosto 23, 2009 Posted by | 1 | , , , | Deixe um comentário

“New Hope for Peace”?

FMEP

A Foundation for Middle East Peace é uma instituição norte-americana que promove a divulgação de informação sobre o conflito israelo-palestiniano. Os seus relatórios mensais sobre os colonatos israelitas são talvez a principal referência nesta questão, e os mapas detalhados que fornece são também importantes instrumentos de análise. Agora, lançam um DVD chamado New Hope for Peace, em que recolhem depoimentos de quatro altas figuras da diplomacia norte-americana que estão ou estiveram de alguma forma ligados ao conflito: Jimmy Carter, James Baker, Brent Scowcroft e Zgibniew Brzezinski. Todos convergem na defesa da (óbvia) solução de dois estados e todos realçam a importância de uma liderança america forte – sobretudo, acrescento eu, quando o interlocutor palestiniano (a Autoridade Palestiniana) continua com pouco poder negocial e uma vontade (no mínimo) limitada e quando os interlocutores israelitas são Netanyahu e Lieberman. A primeira parte do documentário pode ser vista aqui, e abaixo reproduzo algumas das ideias de cada um dos quatro entrevistados.

Jimmy Carter – The overwhelming majority of Israelis and Palestinians want peace… The President should make his policies clear on settlements, home demolitions, Israel security, and East Jerusalem…

James Baker – The vast majority of the Israelis are tired of being a nation perpetually at war…they want to see a secure peace agreement, and so do the Palestinians… Hard liners on both sides are the biggest obstacles to peace…You have to talk to your enemies…

Brent Scowcroft – We must play a more active role…We need to act decisively and comprehensively…The President needs to step up and say “this is the American proposal.” …it will turn around the psychological atmosphere in the Middle East. 

Zbigniew Brzezinski – Two decent peoples are locked in a mortal embrace…they cannot move toward peace unless someone helps… It takes an impartial, energetic outside mediator… there is only one candidate…the U.S., and more specifically the President. 

Junho 29, 2009 Posted by | Sem categoria | , , , | Deixe um comentário

Jerusalem, Washington

DSC06067Junto à Praça do Município, em Jerusalém, encontra-se este mapa gravado numa parede; um mapa-mundi que representa o mundo conhecido de então, com Jerusalém ao centro. Se hoje a Europa é o eixo, se em tempos era a China a ocupar esse lugar, também Jerusalém pôde reivindicar esse estatuto. E, de certa forma, ainda pode. Netanyahu foi a Washington dizer isso mesmo a Obama, com Teerão no pensamento; e é provável que ouça o mesmo acerca da importância de todas as questões relacionadas com a região, mas com uma perspectiva diferente. Obama sabe que, depois do Iraque em 2003, já basta de precipitações naquela zona. E sabe também que, sem um Estado palestiniano viável, não há, nem haverá nunca, uma paz duradoura na região. É por isso que a nota dominante da posição americana para este encontro com o Primeiro-Ministro israelita se relaciona com o processo de paz, e não com uma ofensiva contra o Irão.    

Maio 18, 2009 Posted by | Sem categoria | , , , , , | Deixe um comentário